O assustador número de mortes pela COVID-19, por si só, é capaz de mudar a relação das pessoas com o mundo e como interagimos uns com os outros. O isolamento social aplicado por tanto tempo também altera a dinâmica social, da economia à política. Um ano após as primeiras ações para conter a doença temos diversas evidências de que o mundo já é outro. Mesmo assim, vejo que uma enorme parcela da sociedade que trata o presente como passageiro, crente de que em breve “tudo voltará ao normal”. Mera ilusão.
A maneira de consumir mudou. Confinados dentro de casa ao menos 20 milhões de brasileiros compraram na internet pela primeira vez na vida. A pandemia acelerou as compras online num ritmo nunca visto. A participação do e-commerce no total do varejo brasileiro dobrou de tamanho, passando dos 10%. Neste ano, a China será o primeiro país em que o comércio pela internet venderá mais que o varejo tradicional.
Empreendedores estão diante de uma nova lógica. Ao invés de atrair o consumidor para o estabelecimento a estratégia deve focar em como levar a marca para dentro da casa dele. Bares e restaurantes são negócios que precisam pensar dessa maneira, por muito tempo eles estarão restritos ao ritmo de transmissão do vírus. O mesmo podemos dizer de setores fortemente atrelados ao convívio social: joias, vestuário, eventos.
Bens e serviços
A nossa relação com bens e serviços está diferente. Casas necessitam de funções novas, como por exemplo, a de servir de escritório. Para muitas famílias de uma hora para outra o imóvel perdeu o sentido no novo estilo de vida. Pesquisa da startup unicórnio QuintoAndar mostra que três em cada quatro brasileiros passaram a enxergar suas residências de outra forma.
Posso ainda citar a perda da relevância de escritórios enquanto o trato com dados na web ganha prestígio, a descoberta dos benefícios da telemedicina que até a pandemia custava em avançar dentro da comunidade médica, a entrega de tudo em domicílio que se tornou a alternativa mais viável na quarentena. Na cultura, profissionais se reinventam para fazer arte na internet. Até a forma de procurarmos o amor sofreu profundos impactos. O aplicativo de relacionamentos Tinder acolheu tantos solteiros que lucrou US$ 249 milhões só no terceiro trimestre de 2020.
Um ano após experimentarmos o confinamento é possível afirmar que o mundo mudou. As pessoas se comportam de maneira diferente em relação ao que faziam antes do COVID-19. Elas têm outras prioridades. Muito do que era essencial atualmente não é mais.
Estratégia
Se tudo está diferente, então comete um grave erro estratégico quem toma decisões com base no mundo pré-pandemia. Os fundamentos de ontem pouco valem hoje. Nos negócios, a verdade é que caminhamos cegamente em uma via tomada pela neblina. Precisaremos, portanto, redescobrir valores, redesenhar projetos, investigar sobre como as pessoas se comportam e o que elas desejam.
Logo, depois de um ano com a vida pautada pelo novo coronavírus, se você pensa no futuro com a cabeça no passado então você ainda não entendeu nada.
Texto publicado Por Wladimir D’Andrade no jornal Diário da Região (para assinantes) em março de 2021.